O que queremos com esta cena musical onde tanto colocamos nossas forças?

O que queremos com esta cena musical onde tanto colocamos nossas forças?

É, nem é questão de nostalgia, mas sim uma questão histórica. As pessoas que montaram bandas no começo do que chamamos de punk, hardcore, grind, sabiam que o mundo da cena musical era desprezível, competidor, elitista e mesquinho. Por isto criaram algo alternativo a tudo isto, um lugar onde as pessoas, de forma igualitária, pudessem ter suas bandas, gravar seus discos, organizarem seus próprios shows, festivais, turnês, criar vínculos e construir algo que fosse o oposto de toda aquela merda mainstream que existia. Era a música, a arte, nas mãos do povo e de forma horizontal, onde banda, publico e todos os demais, eram os mesmos e eram importantes.

Esta cena mainstream continua existindo, continua igual, se vendendo, corrompendo pessoas, se auto corrompendo, criando heróis e vendendo música como se vende tênis.

Mas este texto não é sobre isto, é sobre o outro lado, o lado que nos envolvemos anos atrás e que nos mantêm apaixonados ainda e fazendo tudo isso até hoje. Em muitas cidades pequenas, nos bairros das grandes capitais, ainda tem aquela pessoa que acredita que pode ter a sua banda, que carrega sua guitarra barata numa bag rasgada e se arma da sua música para encontrar vida e ferramentas para conseguir se expressar em meio a este mundo opressor. Que gasta o dinheiro do seu trabalho pra pagar o ensaio, pra pagar a condução pra ir para um show, pra comprar uma corda ou uma baqueta, mas volta inspirado e apaixonado por tudo que fez e construiu.

Sim, sabemos que muita coisa mudou, evoluiu, e tantas outras desculpas esfarrapadas que daremos para justificar nossas atitudes atuais. Sabemos que ter banda gera custos, que eventos custam, que turnês precisam de apoio e que é importante nos organizarmos de uma forma que todas as pessoas compartilhem as responsabilidades, de fazer tudo isto funcionar sem ser um peso. Mas precisamos fazer isto de forma oposta ao mainstream, pois nós não somos ele e nem nunca seremos. No máximo, se você tentar muito, será uma cópia odiosa de alguma banda que idolatra. Basta olhar ao seu redor, as bandas que tentaram ser grandes, foram usadas, caíram e continuam dependendo do cenário alternativo para se manterem vivas.

Precisamos parar de tratar pessoas que organizam shows, que mantêm espaços, que organizam turnês, como provedores de serviços para nossas bandas. Devemos parar imediatamente de copiar o mainstream.

A pessoa que organiza um show, na maioria das vezes, também tem uma banda, também compra discos, camisetas, ela é tudo em um espiral que se chama DIY. Vamos parar de colocar nossas bandas como a ultima bolacha do pacote, ela não é.

Passou a hora de pararmos de competir e estimular competições, não há o melhor disco do ano, o melhor clip, não há a banda mais tocada do ano na plataforma mais excludente de streaming do momento. Nossa visão é limitada e só conhecemos as bandas que estão ao alcance das nossas telinhas azuis. Existe muita banda, assim como as nossas bandas foram ou ainda são desconhecidas para a grande maioria das pessoas e elas não estão nesta busca pelo primeiro lugar que cegamente buscamos alcançar.

Vamos construir uma realidade onde possamos nos apoiar mutuamente em nossas turnês, em nossos shows, em nossas banquinhas, em nossas mídias. Quer tocar em uma cidade e precisa de ajuda? Converse com pessoas que fazem isto na tal cidade, pergunte o que ela precisa, ajude, converse, construa junto com ela. Não espere o dia do show para decidir ficar em casa, pois o show não foi bem organizado (ou pelo menos não da forma como você gostaria que fosse e nem se mexeu para ser). Não espere o equipamento dos sonhos nos locais, somos um país onde tudo isto é muito caro e sim, a grande maioria das pessoas que se atrevem a organizar shows, turnês, são trabalhadoras e trabalhadores, que batem cartão, e que depois do expediente estão organizando estas coisas por amor, POR AMOR!

Sim, sabemos, amor não enche tanque de combustivel…mas cooperação pode fazer isto acontecer, e não há cooperação sem amor a aquilo que se envolve.

Uma boa parte de nós está em todos os lugares desta cena alternativa que insistem em segmentar. Temos bandas, organizamos shows, turnês, gravamos discos, e sabemos o quanto é difícil manter todas estas coisas… mas, mais difícil é viver neste sistema opressor e continuamos insistindo, acordando cedo, comendo mal, sem tempo para viver, sem tempo para amar e muito menos ser amado.

É importante analisarmos o que queremos: estar na cena alternativa e agir como parte dela ou estar na cena alternativa usando ela. Se sua resposta for a primeira, vamos construir juntos algo forte e verdadeiro, onde se um tomar prejuízo, todos vão tomar, mas dividiremos também a alegria e a satisfação de termos conseguido juntos fazer algo bom para todas as pessoas. Se a resposta for a segunda, nossos caminhos são opostos, inclusive na vida e quando nos cruzarmos, será de lado opostos das barricadas da vida.

Seguiremos fazendo da forma que nossos corações e nossa politica nos ensinou, tendo equipamentos que podem falhar, mantendo espaços fedidos, lançando discos que encalham de bandas que amamos, dirigindo quilômetros por dia para uma cidade distante, em palcos baixos ou sem palco algum, seremos nós e nossos comparsas que organizaremos turnês, shows e é com estes mesmos que estaremos lutando por uma vida mais justa e livre.

Que essa rede Faça Você Mesma nos traga mais e mais inspiração e força. Que nossos protestos e nossos instrumentos possam expressar nossa indignação e construir uma comunidade musical e anárquica cada vez mais real… Para que ela seja parte de nós ou nos DESTRUA.

No gods No masters ???

CrimethInc. Turnê Brasileira

CrimethInc. Turnê Brasileira

Nas próximas quatro semanas, agentes do coletivo Crimethinc. estarão em turnê pelo Brasil, passando por mais de uma dúzia de cidades debatendo o recém traduzido livro Da Democracia à Liberdade e comparando experiências sobre lutas contra os governos de Jair Bolsonaro e Donald Trump. Muitos outros texto do Crimethinc foram preparados antes dessa turnê e em breve postaremos cada um deles. Fiquem de olho aqui para mais novidades.

  • June 22 — Goiânia/GO — Casa Liberté, Rua 19, Nº 400 — 16h
  • June 23 — Brasília/DF — 19h
  • June 25 — Maringá/PR — R. Prof. Lauro Eduardo Werneck, frente ao DCE
  • June 26 — Curitiba/PR
  • June 27 — Florianópolis/SC — Tarrafa Hacker Clube, pavilhinho da Arquitetura – UFSC — 19h
  • June 28 — Criciúma/SC — Sociedade Secreativa União Operária, Rua Sampaio Viana, 222
  • June 29 — Porto Alegre/RS
  • June 30 — Porto Alegre/RS — Bonobo, R. Castro Alves, 101 – Independência
  • July 2 — São Paulo/SP — Casa Plana, Rua Fradique Coutinho, 1139
  • July 3 — São Paulo/SP
  • July 4 — São Paulo/SP
  • July 5 — São Paulo/SP
  • July 6 — São Paulo/SP — CCS, Rua General Jardim, 253 – Sala 22 —16h
  • July 7 — Santos/SP — Cinemateca de Santos, Rua Xavier de Toledo, Número 42 — 19h
  • July 9 — Divinópolis/MG
  • July 10 — Sete Lagoas/MG
  • July 11 — Belo Horizonte/MG — Kasa Invisível, Av. Bias Fortes, 1034 — 19h
  • July 12 — Belo Horizonte/MG — Escola de Arquitetura, R. Paraíba, 697 — 18h
  • July 13 — Paraty/RJ — FLIPEI
  • July 14 — Rio de Janeiro/RJ — Fosso, Rua Almirante Alexandrino, 405, Santa Teresa
Não estamos no Spotify…. A luta ainda é por LIBERDADE!

Não estamos no Spotify…. A luta ainda é por LIBERDADE!

O punk que se espalhou pelo mundo, em meio a década de 70, carregava algumas propostas muito relevantes e entre elas a questão da negação do controle da música que era mantido por multinacionais (além do combate as multinacionais em si).

O capitalismo sempre se apoderou de tudo para gerar lucro e fez isto com a música, transformou, elitizou e a tirou das mãos do povo, da juventude.
As bandas punks notaram isto e gritaram: Nós faremos a nossa própria música, lançaremos nossos discos e ninguém controlará aquilo que produzirmos, além de nós mesmos.

As bandas começaram a criar seus próprios selos para lançar seus discos. Foi assim com a Crass Records (da banda Crass), Alternative Tentacles (Dead Kennedys), SST (Black Flag), Dischord (Minor threat), e maioria das bandas lançavam elas mesmas seus discos sem selo ou com selos de amigxs ou até mesmo em cooperativas, pois isto facilitava a distribuição e na arrecadação do dinheiro para a prensagem.
Assim se seguiu com a música punk por décadas, o controle da sua música feito por seu próprio selo, pela própria banda, pela sua própria comunidade, negando o apoio às grandes gravadoras.

Com o surgimento da internet e as plataformas digitais a música também passou a ser distribuída através de programas gratuitos onde as pessoas compartilham suas músicas com outras (soulseek) ou colocam em plataformas como myspace ou bandcamp.
Temos uma paixão enorme pela rebeldia e pela contestação que o punk carrega em sua proposta e temos também a certeza de que aqueles que controlam a nossa música também controlam nossos desejos, nossos percursos, nossa comida e muitas coisas que nem podemos imaginar.

Quer trepar? Quer comer? Ir para algum lugar? Ouvir música? Temos para você o Tinder, ifood, uber, spotify…
Pagamos por tudo e quem realmente produz fica com quase nada ou muitas vezes, NADA.
A pessoa que pega uma bicicleta e sai correndo até uma lanchonete pega a encomenda, sai correndo novamente pois tem prazo a cumprir correndo risco de vida, ao final do percurso recebe alguns trocados e é assim também com o spotify. Você monta a banda, ensaia, grava, gasta e eles lucram. Ahhh, e ainda fazemos propaganda gratuita para eles.

Estamos no spotify! (isto sem falar do deezer, apple music e este mundo de multinacionais para as quais trabalhamos gratuitamente fornecendo nossas musicas e colocando os logos de nossas bandas ao lados dos logos destas empresas)
Nós negamos a isto, nós negamos a delegar o controle de nossa música à eles. Qualquer um que ponha suas mãos sobre mim para me controlar será declarado meu inimigo.

Continuaremos fazendo nossa música torta, com nossos sonhos e nossos protestos em nossas letras, continuaremos compartilhando isto com quem está do nosso lado e acreditando uns nos outrxs e com certeza NUNCA será no spotify.

Faça você mesmx sua música. O punk ainda não morreu!

Consumidor x Fornecedor

Consumidor x Fornecedor

Sobre prazo de envio, direitos dos consumidores e ausência de vida.

A No gods No masters não é e nunca será uma empresa ou algo do tipo. Somos uma ideia, somos parte de algo que busca VIDA e combate as relações de poder estipuladas pela força do dinheiro.
Somos contra os direitos do consumidor pois para nós não existe consumidor e nem fornecedor nesta relação, para nós não existe cliente. O que existe é apoio para bandas dentro do faça você mesmo, apoio para escritores e escritoras que falam sobre as coisas que acreditamos, apoio para pessoas que fazem zines, que lançam livros de forma independente, apoio para pessoas que constroem uma midia além das grandes gravadoras, além das midia de massas!

Jamais sairemos correndo para uma agencia dos correios para postar um pacote, jamais.

Nós mantemos a No gods No masters, uma distribuidora de discos, livros, zines, camisetas, por amor e por acreditar na importância deste material circular pelo mundo mas além da No gods No masters nós gastamos nosso tempo tentando escrever textos, tocar nossa música, plantar, se divertir, amar e construir outras relações com as pessoas, animais e o planeta. E tudo tem o seu tempo, seu pacote será feito com carinho e será postado, tenha certeza disto.
Agradecemos a cada pedido que chega em nosso site, o apoio de cada pessoa e entendemos que as pessoas podem ficar com vontade de receber o mais rápido possível aquele material que tanto deseja mas espere um pouquinho, este desejo jamais pode tirar a liberdade de outra pessoa, senão ele será tão opressor quanto tudo aquilo que você tanto odeia.

Enquanto seu novo disco não chega, ouça aquele que você não ouve a muito tempo e convide amigos e amigas para ouvir com você, vista aquela camiseta antiga que você tanto gostava enquanto a nova não chega, escreva um zine enquanto o novo também não chega, encontre pessoas, cozinhe para elas, faça amor, amizades, há tantas coisas para fazer que o seu pacote acabará chegando tão rápido que você nem notará. Assim, juntos, vamos construindo um mundo muito mais forte.
Com amor, No gods No masters

Um pouco do No gods No masters Fest 2017!

Um pouco do No gods No masters Fest 2017!

Autonomia, relações horizontais, faça-você-mesma, senso de comunidade, criação de redes, diálogo, respeito, apoio mútuo… Em imagens, sentidos e palavras, um pouco da segunda edição do No Gods No Masters Fest, em Itanhaém, litoral de São Paulo.

“Um dos pontos mais importantes de nos encontrar é notar que toda luta contra qualquer tipo de opressão merece carinho, merece respeito, merece ser entendida e, se possível, abraçada.
Somos muitas pessoas na mesma frequência mas também somos frequências diferentes que estão lado a lado na luta pela liberdade”.

Sobre paz, amor e um pouco de guerra: relato dos dias com Penny Rimbaud no Brasil

Sobre paz, amor e um pouco de guerra: relato dos dias com Penny Rimbaud no Brasil

* por No gods No masters & Imprensa Marginal

(…) tanto na memória e/ou imaginação de muitas outras pessoas, Crass está praticamente cravado na pedra, uma pedra que porventura irá rolar para o topo de uma colina da qual, com ou sem ajuda, irá eventualmente rolar para baixo novamente. Quando a pedra está no topo da colina, algumas pessoas parecem gostar de poli-la, deixando-a tão brilhante que é possível ver seus próprios rostos nela. Elas querem se ver nela, como se de alguma forma pudessem fazer parte dela, ou a pedra uma parte delas. Elas não querem ver as sujeiras, as partes ásperas, então passam a polir mais e mais até que, em suas frustrações, empurram a pedra, enviando-a novamente colina abaixo. Quando a pedra está no pé da colina, algumas pessoas gostam de mijar nela, como se isso fosse de alguma forma negar seu poder ou pelo menos diminuí-lo. Mas Crass foi ali, numa outra época, e não agora, então como pode este poder ser negado? Não faz diferença nenhuma se a pedra está no topo da colina sendo polida, ou se está no pé da colina sendo mijada. Crass foi um acontecimento; aconteceu e deixou de acontecer. O que outras pessoas fazem dele é da conta delas, o que, na verdade, não tem ligação alguma com Crass. (…) Polir ou mijar, mudança não é estrutural, mas atitudinal; mude você mesmo, mude o mundo, e se as memórias do Crass te ajudarem nisso, ótimo. Se não ajudar, ótimo também.”

Penny Rimbaud, janeiro de 2017

Introdução de “Eles Nos Devem Uma Vida – Crass: Escritos, Diálogos e Gritos”

Foram dias bastante intensos, tanto no sentido objetivo da organização em si, quanto com relação a tudo que vivemos, pensamos e experienciamos durante a rápida passagem de Penny Rimbaud pelo Brasil. Esse relato tenta dar conta de um pouco disso tudo.

Penny, um dos formadores da banda inglesa Crass nos anos 70, então baterista e autor de muitos de seus escritos, letras e panfletos, esteve durante grande parte de sua vida envolvido em projetos e iniciativas contraculturais, artísticas e libertárias, e ainda hoje, aos 74 anos, segue escrevendo, criando, e conspirando novos projetos – que em sua maioria brotam da casa-comunidade Dial House, onde vive desde o final dos anos 60, em meio a um enorme jardim onde plantam parte do que comem e fazem germinar novas idéias e propostas de vida. Foi ali nesse terreno em Essex, Inglaterra, que, ainda no final dos anos 60, decidiu tirar todas as trancas e fechaduras da casa, para criar uma casa aberta a todo tipo de iniciativa subversiva e contracultural… E as pessoas começaram a chegar. Dali muita coisa surgiu, antes, durante e depois do Crass – talvez um dos projetos mais conhecidos nesta história.

Um belo dia, umx de nós foi até a Dial House sem aviso, sem contato prévio, somente com o endereço e a vontade de conhecer de perto essa experiência. E foi recebidx com uma xícara de chá, muita conversa, comida e uma cama para passar a noite – como se aquela pessoa estranha que chegava ali, fosse uma velha amiga de anos. De toda essa receptividade, duas visitas à casa e dois anos de conversa coletiva, nasceu essa pequena turnê pelo Brasil e o livro “Eles nos devem uma vida – Crass: Escritos, diálogos e gritos”, que acaba de sair do forno.

Foram dez dias, com três conversas com Penny durante o No Gods No Masters Fest na Semente Negra, em Itanhaém/SP, uma em São Paulo/SP no SESC Consolação, uma em Divinópolis/MG no Movimento Unificado Negro de Divinópolis organizado pelo Coletivo Pulso, e uma em Belo Horizonte/MG no Cine Santa Tereza, organizado pelo Coletivo Metalpunk Overkill junto a uma linda feira de materiais anarquistas, livros, discos, zines, rango vegano e produtos artesanais de iniciativas autônomas. Durante as atividades também rolou exposição fotográfica com imagens atuais da Dial House, colagens de Gee Vaucher, exibição simultânea de uma vídeo-arte de Penny, e lançamento do livro. Foram dez dias de muita conversa e convivência, algumas idas a praia, ao mar, ao rio, ao histórico Centro de Cultura Social em SP, a uma recente casa okupada em BH, ao espaço do Coletivo Pulso em Divinópolis, à comunidade indígena Awa Porungawa Dju – em um bonito encontro com o Pajé Guaíra, que lhe presenteou com um nome em tupi-guarani. Foram dez dias fazendo pão, cozinhando, compartilhando risadas, experiências, sabedorias, diferentes realidades, e, sobretudo, muito amor. Só o que pudemos ver é uma pessoa muito simples, muito amorosa, com um coração enorme e muita vontade de compartilhar e participar de tudo, da maneira mais horizontal possível, em todos os momentos – e isso se mostrou não apenas nas conversas, mas também no ato de lavar a louça, fazer comida coletivamente, afiar as facas da casa, trocar conhecimentos, ajudar a arrumar, organizar, carregar e o que mais fosse preciso, participar na resolução de problemas, ensinar tai chi chuan, fazer chá… Esse encontro nos gerou muitas reflexões e inquietações, assim como tantas outras pessoas que acompanharam as atividades vieram relatar.

Em algumas de suas falas, Penny falou sobre Crass, Dial House, movimento hippie, punk, anarcopunk, anarquismo de forma mais direta e baseada em suas memórias e críticas. Em outras, tentou introduzir um pouco de suas tantas reflexões filosóficas sobre o que seria esse “si mesmx”, presente na frase “não existe autoridade além de você mesmx”. Falou de amor, paz, zen-budismo, filosofia, e por vezes tentou desconstruir o mito gerado em cima do Crass e sua história, tentando trazer outros pontos em questão, pautados em tudo que se seguiu em sua vida depois da banda. Suas visões e dúvidas sobre nossa realidade, o racismo no Brasil, questões indígenas e outros pontos surgiram no decorrer desses dias. Para além das respostas e reações à agenda imposta pelo sistema e da reafirmação do que é ruim, propôs a importância da criação de novas formas de vida e de tudo o que buscamos e acreditamos. No sentido inverso da imposição de dogmas e intransigências em nossos espaços de atuação, propôs o respeito e o diálogo. Em todos os momentos, paz e amor estiveram presentes nas falas desse velho hippie-punk-zen-inominável.

Crass e toda a história que envolve esta banda-coletivo inglesa, que tanto inspirou outras movimentações e iniciativas anarquistas/punks/libertárias mundo afora, nos inspirou igualmente em muito do que construímos. Enquanto ecoava na Inglaterra dos anos 70 a falta de perspectiva e a inexistência de um futuro, aquele pequeno grupo de pessoas propôs e vislumbrou esse futuro, baseado em um senso genuíno de comunidade, autonomia e liberdade, que poderia ser criado coletivamente se estivéssemos preparadxs para construí-lo. Anarquismo, faça-você-mesma, pacifismo, direitos animais e feminismo foram algumas das ideias que fervilharam nesse contexto, a partir de uma crítica ácida e visceral contra todo o caráter midiático, vendável e banal que o punk ia tomando naquele momento.

Mas não há porque “polir a pedra”: assim como qualquer outra experiência neste sentido, sempre existirão divergências, discordâncias e outras maneiras de fazer as coisas que nos agradam mais ou se adaptam melhor a nossa realidade. Como diz a citação acima, “Crass foi um acontecimento. Aconteceu, e deixou de acontecer”. Pertence a um tempo, a um contexto, a um local geográfico específico, com suas questões sociais, políticas e econômicas. Esperar que este acontecimento preencha nossas próprias necessidades e atenda por completo a nossos contextos não faria sentido algum. “Mijar na pedra” por não ver nela o espelho que gostaríamos, também não faz sentido. O Penny que aqui esteve, com seus 74 anos, seguiu em frente desde aqueles dias de Crass, seguiu adiante com ideais que lhe foram importantes, abandonou outros, e assim segue em meio a toda a sua meditação e ação cotidiana. Muita história, vivência, reflexão e inspiração, com muito amor e um pouco de guerra. Muito ficou aqui, e muito foi para lá – trocando experiências e realidades, na construção de outras maneiras de viver e conviver com o mundo que nos cerca, mudando tudo ao redor. Se essas experiências ajudaram nisso, ótimo. Se não ajudaram, ótimo também.

Não existe autoridade além de nós mesmas, então… tomemos as rédeas de nossas próprias vidas!

Como organizamos eventos

Como organizamos eventos

Como organizamos eventos, cursos, oficinas é um texto para você conseguir entender a forma como organizamos nossas atividades. As vezes pode parecer super chato conversar sobre tudo isso, mas tudo isso é super importante para que todos possam entender o por que os eventos são cobrados e também para construirmos um espaço em que possamos abandonar hábitos e valores opressores de nossa sociedade.

 Este texto também é um espaço para que você possa perguntar, caso tenha dúvidas, para criticar e propor algo.

Como organiza um evento / oficina / curso

1)Primeiro, te convidamos a conhecer nosso site, a ler mais  sobre nós, nossas ideias, as fotos e, principalmente, nossos projetos que vão te dar uma base de como pensamos e como trabalhamos.

2) Nós NÃO somos prestadores de serviços. Nós jamais organizaremos um evento PARA você, faremos isso COM você. Não somos uma empresa, não pagamos funcionários e não lucramos nada com os eventos. Acreditamos que todas nós somos nossas próprias autoridades: ninguém acima e ninguém abaixo. Desta forma, também buscamos uma comunidade que se constrói tendo como base relações de cooperação, respeito e apoio mútuo, distantes das relações de consumo e competitividade que imperam mundo afora. Aqui não temos autoridades, mas VOCÊ MESMA.

3) Nossa organização é baseada na livre vontade, horizontalidade (sem hierarquia), apartidária e todas as decisões são tomadas por consenso, incluindo compartilhamento de trabalho e distribuição de tarefas. Se você estiver organizando um evento ou apenas participando, observe o espaço, o trabalho, as necessidades, problemas e interaja, faça parte, construa!

4) Organizamos apenas eventos que consigam cobrir seus custos, ou seja, auto suficientes. Todas as vezes que organizamos algo, em geral gastamos com luz, água, limpeza, papel higiênico, equipamentos de som (se for o caso) e manutenções em geral. Além do custo, o evento sempre possui custos de transporte e despesas das bandas e/ou das pessoas que darão as atividades. Por todos estes motivos cobramos entrada e/ou inscrições para que o espaço continue acontecendo e que essa rede DIY de cooperação e apoio mútuo cresça de forma sustentável.

E o que é um evento sustentável?

Um evento sustentável é quando conseguimos fazer um evento sem que ninguém fique com o prejuízo. Acreditamos que com um preço justo de inscrição e/ou bilheteria estaremos compartilhando esses gastos igualmente com todas as pessoas que compareceram no evento. Com esse dinheiro pagaremos os custos das atividades, transporte, manutenção e gastos em geral do espaço e do evento. Ah! Estamos abertas para propostas com diferentes maneiras de construção sustentável de eventos.

CAPITALISMO
Você paga caro na bilheteria, é umx telespectadorx e o dono do espaço lucra.
 
ANARQUISMO
Você paga um preço justo, aprende, se diverte,interage, troca e compartilha os gastos do evento com todas as pessoas.
 

5) Todas a alimentação das atividades que organizamos é  VEGANA, ou seja, sem nenhum produto de origem animal.

7) Nós damos preferência para eventos que explorem mais de uma linguagem, por exemplo, um evento com oficinas e música. Temos essa preferência, porque achamos que o evento fica mais completo, com um conteúdo mais forte e com trocas mais dinâmicas. Mas lembre-se, isso é a nossa preferência, NÃO estamos fechadas à outras ideias.

8) Que bom  que você chegou até aqui, isso significa que você quer mesmo saber como gostamos de fazer as coisas. O espaço está aqui para construirmos nossas vivências e manter vivo muito do que gostamos de fazer. Então, vamos produzir, vamos construir juntas momentos que nos fazem pessoas realmente vivas e ativas. Nos escreva: info@nogods-nomasters.com ou contato@cultiveresistencia.org

Construindo relações sem hierarquias

Construindo relações sem hierarquias

Os momentos de não capitalismo, não coerção e não hierarquia, são os momentos em que mais gostamos da companhia das outras pessoas…

Todas as pessoas, em certa medida, estão sendo controladas por outras pessoas que não entendem ou que não se preocupam com o que quereremos e com o que necessitamos – gerentes, proprietários, credores, polícia, tribunais, políticos. E todas nós exercemos poder sobre as outras pessoas, em diferentes graus – em casa, na escola, no trabalho e nas amizades.

Como vamos quebrar este sistema de controle, onde todas nós, de bom ou mau grado, exercemos poder sobre as outras pessoas, forçando-as em ações que elas prefeririam não fazer?

Uma solução é contestar e oferecer alternativas às regras, líderes e hierarquias que estão em grande parte em nossa vida quotidiana e na maneira que moldam nossa função na sociedade. Temos que desenvolver um entendimento diferente do poder – onde as pessoas possam trabalhar uma com as outras, em vez de tentar comandar e controlar. Temos que procurar maneiras de se relacionar sem hierarquia e líderes.

Nós do Cultive Resistência, disponibilizamos um pequeno zine sobre as tomadas de decisão por consenso, para já começarmos a exercer e a entender como podemos trabalhar em nossos coletivos de forma não opressora e levar, também, esses princípios para a nossa vida cotidiana, seja onde você estiver e com que pessoas tiver.

O consenso  tem como objetivo o compromisso de encontrar soluções que sejam aceitáveis para todas as pessoas. Ao invés de votar por algo, de impor algo à alguém, o consenso trabalha criativamente, levando em conta a necessidade de todas as pessoas. O consenso é a busca por um terreno comum, com decisões tomadas com o diálogo entre iguais, que levam a sério todas as pessoas e que reconhecem as pessoas em matéria de igualdade de direitos. Nenhuma decisão será feita contra a vontade expressa de uma pessoa ou de uma minoria. O grupo sempre se adapta às necessidades das pessoas.

Consenso é sobre participação e igualdade de poder. Ele também pode ser um processo muito poderoso para construir comunidades e capacitar as pessoas. Outro benefício do consenso é a de que todas as pessoas possam concordar com a decisão final e, por isso, estarão muitos mais empenhadas em transformar realmente esta decisão em realidade.

Podemos trabalhar em consenso em todos os tipos de grupos: pequenos grupos, comunidades locais, empresas, mesmo nações inteiras e territórios. Entendendo o consenso, você vai notar que muitos de nossos atos, até mesmo no dia a dia, oprimem as pessoas, te colocam em uma situação de hierarquia e consequentemente no papel do opressor.

Faça o download do zine, tire cópia e distribua livremente. Leve para seu coletivo, converse na sua casa, com as pessoas à sua volta e comece a mudar sua comunidade. Uma sociedade que se organiza sem autoridade está sempre resistindo…

Instruções para baixar e montar o zine:

  1. Baixe os dois arquivos (frente e costas): consenso-frenteconsenso-costas
  2. Veja o vídeo abaixo e aprenda a dobrar o zine!
  3. Distribua livremente.

 

Que as nossas palavras tomem nossos corpos e mentes – n. 07

Que as nossas palavras tomem nossos corpos e mentes – n. 07

João Paulo Rangel, mais conhecido como XJoãozinhoX, morador do mundo, mas situado em Salvador, baterista de bandas como Lumpen e Escato entre tantas outras, cozinheiro, amigo e mais um monte de coisa gostosa. Quer saber mais? Vamos lá!

1. Como você vê a importância das suas produções para a comunidade em que você está inserida?

O projeto do qual faço parte, é uma cooperativa de alimentação Vegana, Rango Vegan. Estamos localizadas no bairro do Santo Antônio, Pelourinho. Bairro conhecido por ser uma região de produção cultural. A Rango Vegan tenta promover o veganismo, oferecendo uma alimentação saudável, saborosa e acessível economicamente. Promovemos eventos como shows, oficinas de culinária, bazar, exibição de documentários, palestras e debates.

2. Acha a existência desta comunidade essencial? Porque?

Sim, pela manutenção da cultura, da arte local e do comércio, que é a fonte de renda de muitas pessoas da região. Além da promoção do veganismo.

3. Como você envolve o seu projeto, as suas produções, no seu cotidiano, na sua vida?

A Rango, sempre foi mais do que apenas um trabalho, uma fonte de renda. Ela esta diretamente ligada a ideais que acredito e vivo como, veganismo, anarquismo, cooperativismo. Pra mim, trabalhar fornecendo quentinhas delivery, vai muito além do que levar uma refeição para um cliente, pra mim, cada quentinha que chega a determinada pessoa, é menos sofrimento animal e mais saúde.

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4. Você acha importante ir além do punk/hardcore/anarquismo e chegar com suas ideias para outras pessoas?

Sim, esse é um dos propósitos da RV, levar o veganismo ao maior número possível de pessoas, de forma solidaria e justa. Levando em consideração que grande maioria dos nossos clientes não são veganos ou vegetarianos. E outros se tornaram em contato com a RV.

5. Quais são os próximos planos? Envie-nos link de fotos e um video que acha legal.

Além de continuar com a RV, toco bateria em duas bandas, uma banda instrumental de rock, formada na cozinha da RV (Culinária Guerrilha) e um projeto de MPB, além da formação em kung fu e ser feliz!

Para mudar tudo, comece por todos os lugares.

Para mudar tudo, comece por todos os lugares.

Mudanças climáticas, escassez de água, crises econômicas que ameaçam nossos empregos já instáveis e precários, bem como nosso acesso a alimento, saúde e moradia: a ordem dominante é insustentável em todas as suas formas. Até mesmo os seus maiores representantes, como a mídia, políticos e empresários, admitem que são necessárias mudanças radicais. Mas por que deveríamos pedir ou esperar que essas autoridade tomem a iniciativa?

O que seria, realmente, mudar tudo? Como escolheremos caminhos diferentes?

O projeto “Para Mudar Tudo” tem como objetivo a propaganda das pensamentos e valores libertários e radicais para pessoas que ainda não tiveram contato com essas ideias ou práticas mas que mesmo assim sentem que precisamos resistir à ordem política vigente. Ele conta com um texto introdutório ao pensamento anarquista e em linguagem acessível, levado ao público por diferentes formatos: 4 mil cópias de uma revista impressa com cerca de 50 páginas, uma versão em pdf para download, uma versão em vídeo do mesmo texto com cerca de 8 minutos para circulação na internet, posters e adesivos para serem difundidos nas ruas, espaços libertários, centros sociais, ou mesmo pregado nos quartos de jovens rebeldes. Tudo isso reunido em um site para download gratuito e livre difusão.

Todo o projeto – vídeo, texto, site – foi produzido e adaptado para cerca de 14 idiomas por coletivos locais de cada país para ser lançado ao mesmo tempo nos 5 continentes e propagar o caráter sem fronteiras e cooperativo do anarquismo. Cada versão foi devidamente também adaptada ou reescrita pelos coletivos locais para usada como plataforma de diálogo com indivíduos e iniciativas de cada região. Então, com exemplos, contextos, imagens e linguagens, tentamos falar da nossa realidade e propor formas de resistir às opressões existentes nela. Para conhecer as outras versões, acesse: www.tochangeeverything.com

O site do Para Mudar tudo tem como proposta servir de introdução a pensamentos e ações libertárias e te colocar em contato com grupos e pessoas agindo – ou que aspiram agir – para resistir e transformar a realidade em que vivemos.

Aproveite o conteúdo do site e escreva para distribuir os livretos em sua cidade e comunidade. Entre: paramudartudo.com.